UMA QUESTÃO HUMANITÁRIA
Século XXI, ano de 2022 e em pleno continente europeu, estamos a viver uma das maiores crises humanitárias desde o final da Segunda Guerra Mundial, com a invasão da Rússia à Ucrânia.
O país encontrava-se, e ainda se encontra, algo dividido: por um lado, quem vive mais a oeste tem uma certa ligação à Europa, à União Europeia e à mentalidade ocidental. Por outro lado, quem vive mais a leste, uma maior ligação com a Rússia, com a mentalidade russa/soviética e com a sua cultura. No entanto, todos tinham e têm um objetivo em comum: viver em paz num país democrático, independentemente das suas crenças e ideologias políticas.
Vladimir Putin, com todo o seu poder e com toda a sua mentalidade soviética, conseguiu colocar a Europa e o mundo de joelhos, começando uma “operação militar especial” à Ucrânia, destruindo tudo por onde passa e criando uma crise humanitária sem precedentes.
São já muitas as cidades afetadas pelos bombardeamentos russos. O Presidente russo decidiu encurralar os ucranianos e começar a fechar o cerco, atacando cidades vitais.
Com tropas em alerta e preparadas, Vladimir Putin delineou a sua estratégia, enviando militares para a Crimeia, atacando também cidades-chave como Mariupol, Kherson e Odesa, com o objetivo de bloquear o acesso dos ucranianos ao Mar de Azov e ao Mar Negro, dominando também a maior central nuclear da Europa e uma das maiores do mundo, em Zaporizhzhia; para a fronteira da Rússia com a Ucrânia, nomeadamente para a segunda maior cidade da Ucrânia, Kharkiv; e para a fronteira da Bielorrússia com a Ucrânia, para atacar a capital, Kyiv, e controlar a central nuclear de Chernobyl. Com o controlo das centrais nucleares, o Presidente russo aumenta o seu arsenal e coloca o mundo cada vez mais em alerta, com a ameaça de uma guerra nuclear, o que seria completamente catastrófico.
Assim sendo, as únicas fugas possíveis para quem reside na Ucrânia são apenas duas: ou vão para a Rússia e se juntam a Vladimir Putin, ou fogem para os principais países europeus que fazem fronteira com a Ucrânia, como é o caso da Polónia, Moldávia, Hungria, Roménia e Eslováquia.
Ora, todos sabemos que o Presidente russo é um líder autocrático, e todos sabemos que todos os dias são presas milhares de pessoas nas ruas russas por protestarem contra a guerra, pedindo paz e apelando para que a invasão termine. É notícia também, na Rússia, que os cidadãos estão a ser alvo de revistas aos seus telemóveis por parte da polícia e dos militares nas ruas para que estes possam confirmar que não existem informações contra o seu Presidente e contra a invasão. Quem se recusar, será preso. Ora, quem é que quererá “fugir” para a Rússia, ou mesmo para a Bielorrússia, quando é precisamente a Rússia o país agressor? Só se forem os separatistas pró-russos…porque até já há russos a fugir da Rússia com medo de represálias ou com medo de que Vladimir Putin prima o botão da “Martial Law”, o que proíbe qualquer cidadão russo, do género masculino, entre os 18 e os 60 anos, de sair do país.
Vladimir Putin culpa o ocidente, incluindo a OTAN (NATO, em inglês) por histeria e por ter causado esta guerra, culpando também a Ucrânia por nunca terem considerado a Crimeia como uma anexação legal à Rússia, acrescentando também que as regiões separatistas de Donetsk e de Luhansk deveriam ter sido reconhecidas legalmente como russas. No entanto, todas estas “falhas” que o Kremlin consideram ser razões viáveis, nada justifica as ações levadas a cabo pelo Presidente russo.
Todos os dias os países europeus acolhem milhares de refugiados, com a Polónia a receber a maior fatia, ultrapassando já o milhão de refugiados só em território polaco, com as maiores cidades, como Warsaw, Kraków, Wroclaw, Gdansk e Lódz a receberem o maior número de pessoas, tendo sido já criadas zonas de receção para refugiados, com milhares de doações de alimentos, roupas, artigos de higiene, e ainda com apoio logístico e equipas médicas.
No entanto, os refugiados não se ficam por aqui. Com a Europa e o mundo de braços abertos para acolher quem venha da Ucrânia, são inúmeros os países a organizarem-se e a criarem uma onda de solidariedade incrível para os receber. Portugal organiza inúmeros autocarros para irem à Polónia, à Roménia e à Hungria buscar refugiados para que estes possam chegar seguros a território nacional. Uns têm familiares que os acolhem, outros vão para alojamentos temporários, na esperança de encontrarem uma melhor solução.
À parte de Portugal, quem sai da Ucrânia foge também para França, Alemanha, Áustria, Espanha…e mesmo o Reino Unido. No entanto, os britânicos estão a ser a maior dor de cabeça para quem se quer refugiar da guerra em terras de Sua Majestade, tal é a burocracia para que um país possa receber um refugiado de guerra. Das mais de 18.000 aplicações já feitas por ucranianos e por outras pessoas de outras nacionalidades que fogem da invasão russa, foram aceites apenas…300. É impensável e inacreditável que mesmo num período tão negro da história europeia, refugiados de guerra ainda tenham que enfrentar problemas burocráticos para que possam ser recebidos. Estamos a falar de uma crise humanitária na Europa, em pleno ano de 2022 e a primeira coisa que um país se lembra de fazer é encher os refugiados com “papéis”. Temos que ter mais empatia, mais coração e perceber que há alturas para tudo e há oportunidades para tudo. Deveria ser altura para dizer: “estão a fugir de uma guerra, a deixar o vosso país para trás por questões de segurança e por questões humanitárias, bem-vindos em primeiro lugar, as burocracias ficam para mais tarde”. É só desumano.
Portugal nesse aspeto é um exemplo, acolhendo quem tiver que ser acolhido e apoiando na integração, na educação e no ensino da Língua Portuguesa, no alojamento, na alimentação, na procura de oportunidades de trabalho…e nas tais burocracias que países como o Reino Unido colocam como o primeiro entrave.
As políticas de Boris Johnson e do seu Governo nem sempre foram as mais adequadas, mas para além das sanções económicas severas aplicadas à Rússia, a Putin e aos oligarcas russos, ao envio de equipamento militar e de tropas para as fronteiras com a Ucrânia, há que também ser humano e receber de braços abertos em primeiro lugar, deixando a papelada para o lugar e horas indicadas.
Estamos a falar de uma questão humanitária e, como tal, temos que ser humanos.