VAMOS FALAR DE FUTEBOL…

“Noutros países julgam-te apenas pelos resultados, mas aqui não é ‘ganhaste és bom, perdeste és mau’. Aqui, quando se perde, dizem-te que temos de fazer todo o possível para melhorar. E os jogadores sabem disso, assim como os jornalistas. Normalmente o treinador é o elo mais fraco, mas aqui sinto-me protegido nas minhas decisões.”

Quem terá dito isto? Certamente que não foi nenhum treinador de futebol português, foi Pepe Guardiola, treinador do Manchester City, numa curta entrevista que concedeu ao ex-jogador e ex-adversário do Manchester United, Rio Ferdinand – mas o que é isto, os ingleses devem estar doidos, um ex-futebolista a fazer entrevistas? Ainda por cima a um adversário, onde é que já se viu uma coisa destas?

Pois, meus amigos, esta “anormalidade” vi-a ontem, no canal “A Bola TV”, e só lamentei que a mesma tivesse sido tão curta – foram cerca de 17 minutos preenchidos com perguntas inteligentes e com respostas inteligentíssimas, sérias e honestas, num bate-papo impossível de ver nos nossos canais televisivos onde reinam a peixeirada, o escárnio, o insulto, o clubismo irracional, o ódio ao inimigo, o desrespeito pelo adversário, pelas instituições que regem a modalidade, pelos seus dirigentes, pelos negócios e negociatas promovidos pelos presidentes dos clubes, pelos milhões que se perdem ou se ganham com a venda ou a compra deste ou daquele jogador, deste ou daquele treinador… Nesta curta entrevista, meus amigos, falou-se de futebol, de futebol… e só de futebol – não se ouviu uma palavra sobre os árbitros, sobre os casos Palhinhas e tantos outros, sobre os penáltis que não se marcam a favor do Benfica nem sobre os que beneficiam o Sporting e o FC Porto… enfim, tive o prazer de ouvir os elogios que Guardiola teceu aos seus jogadores, nomeadamente aos portugueses que jogam na sua equipa, tive a oportunidade de ouvir um treinador que não se desculpa com a covid, nem com o estado do terreno, com o árbitro ou com o VAR, com o excesso de jogos, com os calos e a caspa dos seus jogadores, com o destino, com a má sorte, com o Passos Coelho ou com a Rainha… enfim, nesta entrevista vi e ouvi alguém que ama o futebol, que a ele se entrega de alma e coração, que reconhece os seus erros e tenta corrigi-los e que até admitiu – valha-nos Deus! – que na época passada perdeu o campeonato porque o Liverpool estava muito mais forte e mereceu o título, somando uns incríveis 99 pontos!

E o que dizer do entrevistador, o Rio Ferdinand, que foi um defesa duro, intratável, de quem não se esperaria a cordialidade demonstrada, a capacidade e a inteligência de saber perguntar e de saber ouvir? Será que os nossos pedantes jornalistas não se envergonharão por ver alguém, sem os chamados cursos de jornalismo que por aí se tiram a granel, ter desempenhado tão bem o seu papel, sem crispações desnecessárias ou fingidas, sem agressividade estudada ou encomendada?

É assim que se promove o futebol – embora por vezes não concorde com o excesso de zelo exigido pela Federação Inglesa de Futebol – não são aquelas lutas de galos e pintos com que diariamente somos bombardeados que contribuem para a credibilidade de um desporto que já foi rei… mas que por cá se passeia nu, sem vergonha de expor os podres que o norteiam!

Daniel Santos

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